Carta Aberta aos pais/encarregados de educação
Peço licença para dirigir-me a vós.
O meu nome é Miriam Medina, sou mãe, Socióloga, ativista social, ou simplesmente, uma cidadã preocupada com o rumo desse País.
O meu nome é Miriam Medina, sou mãe, Socióloga, ativista social, ou simplesmente, uma cidadã preocupada com o rumo desse País.
Desde 2017, tenho tido uma relação muito próxima com os vossos educandos (milhares deles), nas palestras que ministro nas escolas (sobre a violência no namoro e a violência no contexto intrafamiliar). Desde o momento que entro nas salas de aulas, já dá para ver o sofrimento que eles carregam nos olhos. Durante as palestras há aqueles que choram, outros ficam visivelmente incomodados, "acariciam" as cicatrizes provocadas pela auto mutilação e/ou pelas agressões provocadas pelos pais, familiares e/ ou namorados.
Os jovens estão sendo expostos cada vez mais cedo à pornografia. Há crianças molestadas e abusadas por adultos, e há crianças praticando atos sexuais com outras crianças. [Não dá para partilhar nesse espaço, sob pena de ter este post "derrubado" pelo Facebook.]
Numa localidade meninos estão a ter relações com outros meninos, uma situação chocante. Meninas de 8 anos que já fazem sexo oral, e se gabam por esse "feito". Crianças e adolescentes vivem um verdadeiro inferno dentro de casa, sofrendo todo o tipo de agressão (física, psicológica e sexual), por quem lhes deviam amar e cuidar.
Crianças e adolescentes que relatam pensamentos e tentativas suicídas, tanto pelo sofrimento em casa como também pelo Bullying sofrido nas escolas. Adolescentes que foram fazer trabalho de grupo em casa de colegas, e acabaram sendo abusadas. Crianças e adolescentes que dizem ser órfãos de pais vivos, sem cuidados e sem afetos. Crianças e adolescentes que, depois das aulas não querem voltar para casa, pq sabem o terror que vão viver. Vítimas de abuso sexual que são sempre desacreditadas e/ ou silenciadas e culpabilizadas.
Ultimamente tenho recebido muitas partilhas, de rapazes que foram molestados e/ou abusados, por suas madrastas e empregadas domésticas. Todos relataram terem nojo do próprio corpo.
Todos os dias penso no menino de 11 anos, que partilhou durante a palestra, que foi abusado pelo padrasto e pela namorada do pai. Dói lembrar dos olhinhos dele. O meu sentir hoje é que, todos nós conhecemos alguém que sofreu abuso sexual, e mais convicta disso eu fico, quando recebo partilhas de homens e mulheres que foram abusadas quando crianças, pessoas inclusive que teriam uma voz poderosa, caso tivessem preparados para partilhar com o mundo a sua dor.
Igualmente preocupante, são as muitas meninas com doenças sexualmente transmissíveis. Cedem à chantagem emocional por parte dos namorados, e acabam por terem relações sexuais sem preservativo, como "prova" de amor.
Posso vos dizer com toda a convicção, que o ambiente escolar está doente. Os jovens estão doentes. Não há como falar em saúde mental, com esses jovens passando por tantos traumas desde a tenra idade. Pós as palestras, os professores também partilham comigo suas preocupações, com o tanto de problemas que os jovens levam para as escolas. O tanto de violência que eles mesmos praticam nas escolas. Aliás, se a sociedade Cabo-verdiana quer ficar à par do que se está a passar, é só irmos às escolas. A violência reina nos estabelecimentos de ensino, reproduzem a violência que é muitas vezes vivenciada em casa.
Pais/encarregados de educação, por favor cuidem dos vossos educandos, prestem atenção neles, falem com eles sobre todos os assuntos sem tabus, orientem os vossos educandos, abracem os vossos educandos, escutem os vossos educandos (eles têm muito para vos falar), mas sobretudo cuidem e amem esses meninos e meninas, tão carentes e tão traumatizados. Eu não quero mais ouvir "me droguei, me prostitui só para chamar a atenção dos meus pais, porque pelo menos estavam por perto, ainda que fosse só para brigarem comigo. Mas estavam por perto".
Os abraços que os vossos educandos me pedem, eles gostariam de recebê-los de vocês.
Infelizmente [esse espaço] não me permite escrever toda a dor que trago na alma. Estar de frente com os vossos filhos e escutar tantas atrocidades que vivem, dilacera o meu coração.
Estamos a viver numa sociedade doente e promíscua.
Sejamos todos um agente de mudança, pois, esta é uma luta de todos nós. Apostemos na educação, aquela que deve vir de casa.
As partilhas me são confiadas e de todo não posso defraudá-las. Porém, por vezes me sinto impotente. Sigo fazendo o que eu posso e o que me permitem fazer. Quem de direito que façam ouvir essas vozes silenciadas. Por que não vemos ou fingimos não ver, o que está tão perto de nós?
Obrigada pela vossa atenção.
Um agradecimento especial aos parceiros, que me têm permitido realizar esse trabalho.
~ Socióloga, Miriam Medina
Os jovens estão sendo expostos cada vez mais cedo à pornografia. Há crianças molestadas e abusadas por adultos, e há crianças praticando atos sexuais com outras crianças. [Não dá para partilhar nesse espaço, sob pena de ter este post "derrubado" pelo Facebook.]
Numa localidade meninos estão a ter relações com outros meninos, uma situação chocante. Meninas de 8 anos que já fazem sexo oral, e se gabam por esse "feito". Crianças e adolescentes vivem um verdadeiro inferno dentro de casa, sofrendo todo o tipo de agressão (física, psicológica e sexual), por quem lhes deviam amar e cuidar.
Crianças e adolescentes que relatam pensamentos e tentativas suicídas, tanto pelo sofrimento em casa como também pelo Bullying sofrido nas escolas. Adolescentes que foram fazer trabalho de grupo em casa de colegas, e acabaram sendo abusadas. Crianças e adolescentes que dizem ser órfãos de pais vivos, sem cuidados e sem afetos. Crianças e adolescentes que, depois das aulas não querem voltar para casa, pq sabem o terror que vão viver. Vítimas de abuso sexual que são sempre desacreditadas e/ ou silenciadas e culpabilizadas.
Ultimamente tenho recebido muitas partilhas, de rapazes que foram molestados e/ou abusados, por suas madrastas e empregadas domésticas. Todos relataram terem nojo do próprio corpo.
Todos os dias penso no menino de 11 anos, que partilhou durante a palestra, que foi abusado pelo padrasto e pela namorada do pai. Dói lembrar dos olhinhos dele. O meu sentir hoje é que, todos nós conhecemos alguém que sofreu abuso sexual, e mais convicta disso eu fico, quando recebo partilhas de homens e mulheres que foram abusadas quando crianças, pessoas inclusive que teriam uma voz poderosa, caso tivessem preparados para partilhar com o mundo a sua dor.
Igualmente preocupante, são as muitas meninas com doenças sexualmente transmissíveis. Cedem à chantagem emocional por parte dos namorados, e acabam por terem relações sexuais sem preservativo, como "prova" de amor.
Posso vos dizer com toda a convicção, que o ambiente escolar está doente. Os jovens estão doentes. Não há como falar em saúde mental, com esses jovens passando por tantos traumas desde a tenra idade. Pós as palestras, os professores também partilham comigo suas preocupações, com o tanto de problemas que os jovens levam para as escolas. O tanto de violência que eles mesmos praticam nas escolas. Aliás, se a sociedade Cabo-verdiana quer ficar à par do que se está a passar, é só irmos às escolas. A violência reina nos estabelecimentos de ensino, reproduzem a violência que é muitas vezes vivenciada em casa.
Pais/encarregados de educação, por favor cuidem dos vossos educandos, prestem atenção neles, falem com eles sobre todos os assuntos sem tabus, orientem os vossos educandos, abracem os vossos educandos, escutem os vossos educandos (eles têm muito para vos falar), mas sobretudo cuidem e amem esses meninos e meninas, tão carentes e tão traumatizados. Eu não quero mais ouvir "me droguei, me prostitui só para chamar a atenção dos meus pais, porque pelo menos estavam por perto, ainda que fosse só para brigarem comigo. Mas estavam por perto".
Os abraços que os vossos educandos me pedem, eles gostariam de recebê-los de vocês.
Infelizmente [esse espaço] não me permite escrever toda a dor que trago na alma. Estar de frente com os vossos filhos e escutar tantas atrocidades que vivem, dilacera o meu coração.
Estamos a viver numa sociedade doente e promíscua.
Sejamos todos um agente de mudança, pois, esta é uma luta de todos nós. Apostemos na educação, aquela que deve vir de casa.
As partilhas me são confiadas e de todo não posso defraudá-las. Porém, por vezes me sinto impotente. Sigo fazendo o que eu posso e o que me permitem fazer. Quem de direito que façam ouvir essas vozes silenciadas. Por que não vemos ou fingimos não ver, o que está tão perto de nós?
Obrigada pela vossa atenção.
Um agradecimento especial aos parceiros, que me têm permitido realizar esse trabalho.
~ Socióloga, Miriam Medina